RESENHA DA LEI ANTICORRUPÇÃO (Nº 12.846/2013)

Pretende-se com a presente resenha fazer-se uma análise sucinta a respeito da Lei nº 12.846/2013, a qual dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências.

O tema foi escolhido sobretudo pelas novidades que a lei traz no tocante à responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas, o compliance, o acordo de leniência, o Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP, o que é de suma importância para a seara da Administração Pública.

Assim, destaca-se que o capítulo I da Lei nº 12.846/2013 traz as disposições gerais; o II trata dos atos lesivos à administração pública nacional ou estrangeira; o III da responsabilização administrativa; o IV do processo administrativo de responsabilização; o V do acordo de leniência; o VI da responsabilização judicial; e o VII das disposições finais.

Como não se tem muito espaço na presente resenha para a abordagem específica de cada um dos dispositivos da lei, abordar-se-ão os principais e/ou mais relevantes para o estudo ora em voga. [1]

Capítulo I. O capítulo I traz as disposições gerais e, consoante o parágrafo único do artigo 1º, o disposto na lei se aplica tanto às sociedades empresárias quanto às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, assim como a quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente. Ou seja, aqui estão elencados os sujeitos ativos e passivos aos quais incidirão a lei.

A responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas dar-se-á tanto em âmbito administrativo quanto civil e merece destaque ainda, o fato de que a responsabilização não exclui a responsabilidade individual dos dirigentes ou administradores ou mesmo qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito. [2]

Capítulo II. O capítulo II cinge-se a elencar os atos lesivos à administração pública nacional ou estrangeira, considerando ser lesivo todo ato praticado pelas pessoas jurídicas mencionadas no § 1º do artigo 1º da Lei, que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, princípios da Administração Pública ou ainda contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.

Capítulo III. O capítulo III dispõe sobre as sanções aplicadas às pessoas jurídicas e, para tanto, infere-se que em âmbito administrativo as sanções aplicadas pelos atos lesivos são: multa e publicação extraordinária da decisão condenatória. Ressalva-se ainda que a aplicação das sanções não exclui, em qualquer hipótese, a obrigação da reparação integral do dano causado. [3]

Merece evidência neste capítulo, sobretudo, o instituto do compliance que, como já dito, apresenta-se como um dos avanços previstos na lei no que tange à ética e à transparência das relações negociais havidas entre a Administração Pública e o setor privado. De acordo com o compliance as empresas devem demonstrar um padrão de conduta que seja condizente com a boa-fé objetiva.

Destarte, pela leitura do art. 7º, VIII, depreende-se que se concede benefício de atenuação da pena às empresas que se dispuserem a combater eficazmente a corrupção e, para isso, podem inserir canais de ouvidoria e de denúncia, código de ética e/ou conduta com o intuito de prevenção à prática do cometimento de ato ilícito, bem como implantar mudança cultural no modo de agir das pessoas jurídicas que contratam com a Administração Pública.

Capítulo IV. O capítulo IV aduz que a instauração e julgamento do processo administrativo disciplinar (PAD), a fim de apurar a responsabilidade das pessoas jurídicas, cabe à autoridade máxima de cada órgão ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que agirá de ofício ou mediante provocação, observados o contraditório e a ampla defesa, conforme preconiza o artigo 8º.

Já o artigo 9º aduz que compete à Controladoria-Geral da União – CGU apurar, o processo e o julgamento dos atos ilícitos previstos na Lei, praticados contra a administração pública estrangeira, devendo-se observar ainda o disposto no Artigo 4º da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais.

Capítulo V. O capítulo V prevê o acordo de leniência, o qual merece uma ressalva a fim de esclarecer que tal acordo não é exclusivo da lei anticorrupção, eis que a antiga lei antitruste já havia o inaugurado. O acordo é celebrado entre a autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública, junto às pessoas jurídicas responsáveis pelo cometimento de atos lesivos à Administração Pública que colaborarem de maneira efetiva com a investigação e o processo administrativo, é uma espécie de delação premiada.

Contudo, da colaboração deve resultar a identificação dos demais envolvidos na infração, quando couber, bem como a obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração, tal como dispõem os incisos I e II do artigo 16.

O acordo de leniência somente será celebrado se, “cumulativamente” restarem preenchidos três requisitos: a pessoa jurídica ser a primeira a se manifestar sobre seu interesse em cooperar para a apuração do ato ilícito; a pessoa jurídica cessar completamente seu envolvimento na infração investigada a partir da data de propositura do acordo e; a pessoa jurídica admitir sua participação no ilícito e cooperar plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento. [4]

Importante destacar que o acordo de leniência não exime a pessoa jurídica da obrigação de reparar integralmente o dano causado e, no caso de descumprimento do acordo de leniência, a pessoa jurídica ficará impedida de celebrar novo acordo pelo prazo de 3 (três) anos contados do conhecimento pela administração pública do referido descumprimento. [5]

Capítulo VI. No tocante ao capítulo VI, que trata da responsabilização judicial, tem-se que na esfera administrativa, a responsabilidade da pessoa jurídica não afasta a possibilidade de sua responsabilização na esfera judicial, tal como preconiza o artigo 18 da lei. Ainda, as sanções que serão aplicadas às pessoas jurídicas infratoras poderão se dar de maneira isolada ou cumulativa. [6]

Dentre as sanções, previstas no artigo 19, destaca-se: perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé; suspensão ou interdição parcial de suas atividades; dissolução compulsória da pessoa jurídica; proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos.

Capítulo VII. No âmbito das disposições finais do capítulo VII, merece destaque o CNEP (Cadastro Nacional de Empresas Punidas), gerido pela CGU, que reúne e dá publicidade às sanções aplicadas pelos órgãos ou entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de todas as esferas de governo. Importante frisar que, de acordo com o artigo 24, a multa e a perda de bens, direitos ou valores aplicados com fundamento na Lei, serão destinados preferencialmente aos órgãos ou entidades públicas lesadas.

Outro artigo importante referenciado no capítulo é o artigo 27 que preceitua que a autoridade competente que, tendo conhecimento das infrações previstas na Lei, não adotar providências para a apuração dos fatos será responsabilizada penal, civil e administrativamente.

Também, e não menos importante, destaca-se que a Lei é aplicável aos atos lesivos praticados por pessoa jurídica brasileira contra a administração pública estrangeira, ainda que sejam cometidos no exterior. [7]

Portanto, conclui-se com o presente estudo que as inovações trazidas com a Lei nº 12.846/2013 se mostram de suma importância para o combate à corrupção, pois ela é mais abrangente, eis que trata de todas as esferas da Administração Pública, assim como respectivos órgãos e entidades.

Ademais, a Lei é clara e aplica punições mais severas às empresas que tentam lesar a administração pública. Inclusive, hoje estas empresas podem ser punidas tanto civil quanto administrativamente pelos atos lesivos que praticarem.

Na responsabilidade civil, imprescindível que se tenha um dano passível de indenização, há um nexo causal entre a conduta e o dano e este nexo é que gera a responsabilidade; já na responsabilidade administrativa, as sanções são impostas diante da existência de um PAD, tendo como sanções desde a aplicação de multas, suspensão, interdição, impedimento, etc.

Nesta senda, por meio da responsabilidade objetiva, as empresas podem ser punidas por atos de corrupção, independentemente de culpa, bastando a comprovação de que tais atos tenham sido praticados em seu interesse ou benefício. E, antes do advento da Lei nº 12.846/2013, não se conseguiam alcançar resultados expressivos em relação aos comportamentos antiéticos que as empresas demonstravam.

Apenas para finalizar, saliente-se que, no caso da aplicação de multa para casos de corrupção, por exemplo, esta é expressiva, considerando que pode até mesmo levar uma empresa à falência. O montante pode chegar a 20% do faturamento bruto anual, tudo vai depender do tamanho e do valor da empresa, ou seja, será muito mais interessante às empresas manterem um comportamento pautado no princípio da boa-fé que intentarem lesar a Administração Pública.

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[1] Para fins de espaço, ressalte-se, desde logo, que os dispositivos de lei, que aqui serão abordados, serão suprimidos em sua maioria, porém todos são atinentes à Lei nº 12.846/2013.

[2] Artigos 2º e 3º, ambos da Lei nº 12.846/2013.

[3] Artigo 6º, I e II, § 3º, da Lei nº 12.846/2013.

[4] Artigo 16, I, II e III, § 1º, da Lei nº 12.846/2013.

[5] Artigo 16, §§ 3º e 8º, da Lei nº 12.846/2013.

[6] Artigo 19, § 3º, da Lei nº 12.846/2013.

[7] Artigo 28, da Lei nº 12.846/2013.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm. Acesso em: 12 jun. 2021.

*OBS.: Imagem disponível em: Según estudio, el nivel de corrupción en la sociedad influye en la honestidad del ciudadano | TECNOLOGIA | CORREO (diariocorreo.pe)

 

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