A multiparentalidade sob o viés da socioafetividade paterna e o exercício da autoridade parental

Não é ousadia dizer que o direito de família é o ramo jurídico que mais experimenta – vivencia – constantes evoluções ao longo do fator tempo, eis que se adapta e se amolda às exigências da vida e momento presente.

Há pouco tempo ainda, no que diz respeito ao estado de filiação, é importante ressaltar que no ordenamento jurídico brasileiro, mal se podia falar em “filhos fora do casamento”, pois eram considerados ilegítimos ou espúrios e, de repente, num passo repentino, hoje podemos ver até mesmo filhos com mais de um pai, como é o caso da multiparentalidade.

Dessa forma, denota-se que o “fenômeno” da multiparentalidade veio para remodelar os antigos conceitos de família, ele faz com que repensemos a maternidade, a paternidade, a filiação e o parentesco. Nesse sentido, a propósito, tem-se que: [1]

Aos poucos, outros traços profundamente arraigados em nossa cultura se viram rotos pela ação do tempo. Com isso, foi o fim do patriarcalismo, base da hierarquia entre homens e mulheres, que conferia aos primeiros poderes e direitos ilimitados sobre patrimônio e pessoa de suas esposas. Foi o fim também da discriminação entre filhos, designados como legítimos e ilegítimos, segundo sua origem.

A multiparentalidade decorre do reconhecimento de um filho pelo pai biológico e pelo pai socioafetivo de forma concomitante, ou seja, há um vínculo afetivo e um vínculo biológico (consanguíneo) necessariamente. Frisa-se que a afetividade se faz indispensável para o reconhecimento de uma relação multiparental. Dessa forma: [2]

O surgimento da multiparentalidade versa sobre a manutenção dos vínculos familiares com a família dos pais, trata sobre uma extensão da família decorrente dos laços afetivos. O reconhecimento multiparental invés da adoção mantém a linha de parentesco entre a família natural além de um vínculo civil culminando em uma verdadeira pluralidade de parentesco, na qual possibilita mais direitos e deveres na ordem civil. Portanto o reconhecimento multiparental acarreta consequências jurídicas no ordenamento jurídico nacional, nos quais são derivam dos princípios da paternidade responsável e da solidariedade familiar.

A socioafetividade é o exercício da autoridade parental, ou seja, aquele pai que não é o genitor biológico desincumbe-se de criar e educar o filho menor, a fim de que este construa sua personalidade e sem que haja vínculo consanguíneo portanto. Destarte, o que acaba por gerar o vínculo jurídico da parentalidade socioafetiva é o próprio exercício da autoridade parental, que é externado pelas condutas objetivas da criação, educação, assistência à prole. [3]

Nesta senda, tem-se que o “reconhecimento de situações fáticas representadas por núcleos familiares recompostos traz novos elementos sobre a concepção de paternidade”. Desvincula-se o fator biológico e realça a função biopsicossocial da paternidade. [4]

Afinal, no ordenamento jurídico pátrio, a posse do estado de filho, como se sabe, somente caracteriza-se se preenchidos e comprovados os requisitos do trato, nome e fama. Assim, basta aos pais socioafetivos se identificarem como detentores fáticos da autoridade parental, criando, educando e assistindo aos filhos.

Portanto, resta certo que a multiparentalidade surgiu para remodelar o direito de família que ainda se encontrava bastante arraigado às tradições patriarcalistas, permitindo que, hoje, as famílias sejam constituídas de forma que atendam às exigências e/ou necessidades de livre desenvolvimento da personalidade. Logo: [5]

Ignorar o fenômeno da multiparentalidade pode representar agressão a direitos fundamentais da criança e do adolescente, por lhes suprimir convivência familiar, assistência moral e material em relação àqueles que se responsabilizaram faticamente pela prática de condutas típicas da tríade criar, educar e assistir. E não fazê-lo apenas pelo aprisionamento a um paradigma codificado anterior, não é razão suficiente para ilidir a diretriz constitucional de ampla tutela dos menores.

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[1] TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado & RODRIGUES, Renata de Lima. 2015. “A multiparentalidade como nova estrutura de parentesco na contemporaneidade”. Revista Brasileira de Direito Civil, vol. 4. Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2023.

[2] CAVALCANTI, João Paulo Lima; LIMA & Lucicleide Monteiro dos Santos. 2021. Multiparentalidade: uma análise entre o reconhecimento e seus efeitos no âmbito do direito da família. Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2023.

[3] TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado & RODRIGUES, Renata de Lima. 2015. “A multiparentalidade como nova estrutura de parentesco na contemporaneidade”. Revista Brasileira de Direito Civil, vol. 4. Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2023.

[4] Ibid.

[5]
Ibid.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAVALCANTI, João Paulo Lima; LIMA & Lucicleide Monteiro dos Santos. 2021. Multiparentalidade: uma análise entre o reconhecimento e seus efeitos no âmbito do direito da família. Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2023.

TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado & RODRIGUES, Renata de Lima. 2015. “A multiparentalidade como nova estrutura de parentesco na contemporaneidade”. Revista Brasileira de Direito Civil, vol. 4. Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2023.

*OBS.: Imagem disponível em: http://yuvambahcesehir.com/

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