A LGPD e o tratamento de dados sensíveis das crianças em tempos de sharenting
Sharenting a fusão da palavra “share” com “parenting” que, respectivamente, em tradução livre da língua inglesa para a portuguesa significa “compartilhar” e “parentalidade”.
Nos dias de hoje já não mais é surpresa para ninguém (ou pelo menos para grande parte dos usuários das redes sociais) encontrar perfis de crianças, por vezes até adultizadas, em busca de likes e seguidores. Vivemos a era do like, da disputa por seguidores, portanto.
Dessa forma, muitos pais utilizam-se para tanto da imagem de seus filhos para lograr êxito em tal intento, até mesmo porque, hoje em dia, os perfis atraentes fazem parte de um mercado lucrativo. Contudo, tal questão merece preocupação e cautela, haja vista que se está falando de indivíduos hipervulneráveis, como as crianças, que não têm o condão de dimensionar o perigo que uma simples postagem pode lhes causar.
Como ficará protegida a imagem de uma criança que sem ter nem mesmo o mínimo conhecimento (partindo-se do pressuposto de um bebê, por exemplo) dispõe de um perfil público com milhões de seguidores desconhecidos, obviamente, e com alcance mundial? Será que esta criança, anos adiante, irá gostar de ter sido excessivamente exposta e mesmo ao alcance de qualquer um?
Neste cenário, é imprescindível que as crianças sejam protegidas sob a luz do princípio do melhor interesse da criança (previsto na Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, da Organização das Nações Unidas (ONU), sobretudo pelo fato de que as redes sociais podem expor dados sensíveis das crianças. Acredita-se que grande parte dos pais nem mesmo sabe do que se trata um dado pessoal, por exemplo. [1]
Nesse sentido, no tocante à questão do sharenting e ao tratamento dos dados sensíveis das crianças merece destaque a lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, que dispõe sobre a lei geral de proteção de dados pessoais (LGPD), eis que traz no caput do seu artigo 14 que “o tratamento de dados pessoais de crianças e de adolescentes deverá ser realizado em seu melhor interesse, nos termos deste artigo e da legislação pertinente.” [2]
Veja-se, os perigos de uma superexposição em redes são inúmeros, principalmente pelo fato da exposição de dados sensíveis das crianças, fato que gera preocupação no âmbito do exercício da parentalidade. Aliás, não se deve atentar tão somente para o fato da rede social em si, mas também para o uso geral da internet.
A propósito, no que tange à privacidade infantil, Benjamin Schmueli e Ayelet Blecher-Prigat ponderam que “a geração mais observada em toda a história” compete às crianças da atualidade, a chamada “geração alpha”. [3]
Logo, não se pode dimensionar, muito menos prever se as crianças de hoje restarão contentes, no futuro, quando perceberem uma espécie de “dossiê” de suas vidas, diga-se de passagem. Os pais e o estado devem atentar para a proteção integral das crianças.
No mais – e não menos importante –, de se falar e também atentar-se a respeito da chamada “deep web” (web profunda, em tradução livre) ou para alguns “dark web” (web escura, em tradução livre), que é uma espécie de mercado obscuro da internet, onde crimes virtuais, e conteúdos ilícitos trafegam livremente.
Logo, mais uma vez, a necessidade de proteção da imagem, da privacidade do público infantil deve ser respeitada, preservada, é uma questão de amor, de dever de cuidado. E, no que tange aos perigos da exposição da imagem das crianças em redes sociais, a título de exemplo, tem-se desde roubo de identidade à pedofilia. A propósito: [4]
“O primeiro desses riscos é o de roubo de identidade, a partir de fotos e informações pessoais obtidas online. Crianças são vistas como alvo em potencial para esse tipo de roubo porque, como passam anos da infância sem precisar de determinados documentos, de pedidos de conta bancária ou crédito financeiro, elas podem ter suas informações usadas ilegalmente por muito tempo sem que isso seja detectado.
Um relatório de 2018 do banco britânico Barclays estima que “mais uma década de pais que compartilham excesso de informações pessoais online” produzirá 7,4 milhões de incidentes de fraude de identidade até 2030.”
Portanto, resta evidente que há mais demonstração de perigo a benefícios, no tocante à questão do sharenting. Isso porque os pais não dispõem de um conhecimento aprofundado acerca dos perigos que seus filhos enfrentam diante da internet. A questão é ampla e discutível, até mesmo pode-se antever que em um futuro bem próximo, haverá judicialização do que poder-se-á compartilhar ou não.
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[1] Dado pessoal vai desde informações acerca da família a questões profissionais, religiosas, sociais, íntimas, dentre outras. “Art. 5º, I. “dado pessoal: informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável.” (BRASIL. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018. Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Disponível em: < L13709 (planalto.gov.br)>. Acesso em: 17 out. 2022.)
[2] BRASIL. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018. Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Disponível em: < L13709 (planalto.gov.br)>. Acesso em: 17 out. 2022.
[3] BBC BRASIL. Paula Adamo Idoeta: ‘Sharenting’: quando a exposição dos filhos nas redes sociais não é necessariamente algo ruim. Disponível em: <‘Sharenting’: quando a exposição dos filhos nas redes sociais não é necessariamente algo ruim – BBC News Brasil>. Acesso em: 16 out 2022.
[4] BBC BRASIL. Paula Adamo Idoeta: ‘Sharenting’: quando a exposição dos filhos nas redes sociais não é necessariamente algo ruim. Disponível em: <‘Sharenting’: quando a exposição dos filhos nas redes sociais não é necessariamente algo ruim – BBC News Brasil>. Acesso em: 16 out 2022.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BBC BRASIL. Paula Adamo Idoeta: ‘Sharenting’: quando a exposição dos filhos nas redes sociais não é necessariamente algo ruim. Disponível em: <‘Sharenting’: quando a exposição dos filhos nas redes sociais não é necessariamente algo ruim – BBC News Brasil>. Acesso em: 16 out 2022.
BRASIL. Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018. Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Disponível em: < L13709 (planalto.gov.br)>. Acesso em: 17 out. 2022.
*OBS.: Imagem disponível em: https://blog.pregistry.com/sharenting-2/
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